Terceiro seminário formativo sobre Direitos Humanos aplicados à Justiça Criminal na Província de Sofala com o tema "Criança em Conflito com a Lei"
O seminário tinha como público alvo acadêmicos, sociedade civil, advogados, juízes, procuradores, Polícia da República de Moçambique da Província de Sofala.
A primeira oradora, Dra. Elisa Samuel Boerekamp, Directora do CFJJ apresentou o Quadro Legal Nacional e Internacional sobre Crianças em Conflito com Lei. A apresentação iniciou com a problematização dos conceitos a volta da expressão criança em conflito com lei, que se mostra não uniformizada em vários instrumentos legais e com inúmeras designações, tais como crianças, menores e jovens.
Na apresentação, a oradora destacou os princípios transversais de justiça para criança. O artigo 40 da Convenção dos Direitos da Criança defende que as crianças devem ser tratadas como tal, pois a maior parte das vezes não cometem crimes por vontade própria mas sim porque são coagidas pelas condições adversas ao seu redor. Em segundo, a Directora do CFJJ anunciou o princípio do melhor interesse da criança, que defende que as crianças diferem dos adultos em seu desenvolvimento físico e psicológico e em suas necessidades emocionais e educacionais, sendo que essas e outras diferenças são as razões para a existência de um sistema de justiça juvenil separado e que exige um tratamento diferente para as crianças respeito aos adultos.
A oradora prosseguiu com a apresentação falando do quadro legal internacional, destacando o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos de 1966 (art. 10), que declara que as crianças devem ser separadas dos adultos e julgadas o mais rápido possível. A Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (art. 37 e 40) impõe a proibição de detenção irregular e ilegal.
A Dra.Tina Lorizzo, Directora da REFORMAR, foi a segunda oradora que apresentou os resultados de duas pesquisas, uma feita em 2015, intitulada Crianças em Conflito com a Lei: Em busca de uma Estratégia de Protecção e outra feita em 2019, intitulada Crianças em Conflito com a Lei: Acesso à Assistência Jurídica e Programas de Reabilitação e Reinserção Social. Usando os resultados da pesquisa de 2015, a oradora demonstrou que a percentagem de crianças reclusas aumentou consideravelmente entre 2015 até 2018, sendo que as crianças em 2015 constituíam 9% da população reclusoria. Esta percentagem subiu pra 13% em 2017 e em 2018 subiu para 16%. Ainda no quadro dos resultados da pesquisa feita no ano de 2015, a oradora demonstrou que a detenção da maioria das crianças aconteceu fora do quadro do Acórdão 4/CC/2013 do Conselho Constitucional. As condições de detenção nas esquadras da polícia são também deploráveis. A oradora ressaltou também os desafios das crianças no processo de julgamento e sentença. As crianças tinham pouco entendimento do funcionamento do processo judicial e quanto a execução da pena, nos estabelecimentos penitenciários havia falta de separação e falta de um programa de reabilitação e reinserção social.
Quanto ao estudo de 2019, a REFORMAR verificou os desafios ligados à assistência jurídica. A Procuradoria-Geral da República, assim como o Instituto de Patrocinio e Assistência Jurídica não dispoem de políticas ou directrizes internas sobre a prestação de serviços de assistência jurídica adequada e eficaz para crianças em conflito com a lei. No âmbito de programas de reabilitação e reinserção social, a REFORMAR notou que departamentos especializados e pessoal designado que possa lidar especificamente com programas de reabilitação e reinserção social para crianças em conflito com a lei não existam seja a nível dos estabelecimentos penitenciários que no âmbito do trabalho do Ministério do Genero, Criança e Acção Social. Em geral, as recomendações deixadas para as diversas instituições que lidam com a justiça juvenil no país olham à necessidade de criar políticas internas e departamentos especializados que lidem com as crianças em conflito com a Lei.
Findas as apresentações, seguiu-se ao debate que uniu os painelistas e os demais participantes. Os participantes defenderam que é necessário formar todos os integrantes do sistema de justiça sobre o tratamento que se deve ter com as crianças em conflito com a lei.