A REFORMAR participa do Fórum de Articulação para Implementação da Legislação das Penas não Privativas de Liberdade
O evento teve início com a intervenção do Director Geral do SERNAP, Dr. Jeremias Cumbe, seguido pela intervenção da S.Excelência Vice Ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Dr. Filimão Joaquim Suazi, que fez a contextualização do assunto. Na sua intervenção, o Vice Ministro, congratulou o compromisso do Governo em descongestionar os Estabelecimentos Penitenciários, através da Lei de Amnistia e Perdão. Exortou também que o Novo Código Penal trás certos desafios, no que respeita a sua implementação e interpretação. Desde logo destacou a questão da nova terminologia, de penas alternativas a pena de prisão para penas não privativas da liberdade.
Após os discursos de boas vindas bem como da contextualização, seguiu-se a secção das apresentações. O primeiro orador foi o Venerando Juiz Conselheiro do Tribunal Supremo, Dr. Luís Mondlane, que abordou o tema sobre o “Quadro legal das Penas não Privativas de Liberdade. Intervenientes na Execução das Penas não Privativas de Liberdade (TrabalhoSocialmente Útil). Cooperação e Articulação Necessária. Na sua intervenção, o Venerando Juiz Conselheiro destacou que as penas alternativas não devem ser consideradas alternativas, mas sim, devem ser usadas como primeiro recurso quando assim a lei o permitir.
A nível nacional, a Constituição da República de Moçambique é o primeiro dispositivo que subordina-se ao princípio da legalidade, conforme estabelecido no número 3 do artigo 2. A nível internacional, encontra-se o exemplo das Regras de Tóquio, e regionalmente, a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos.
O orador fez alusão à primeira pena não privativa de liberdade, que foi o serviço à comunidade, usado pela primeiravezna Rússia, em 1926.
Após a apresentação do quadro legal das penas não privativas de Liberdade, seguiu-se a apresentação sobre “Alternativas à Prisão: Implementação do Trabalho Socialmente Útil 2015 – 2019”, na voz da Dr. Tina Lorizzo, Directora da REFORMAR – Research for Mozambique. Na sua apresentação, a oradora iniciou a sua apresentação, fazendo uma contextualização, na qual compartilhou que dados do SERNAP de 2017, apontavam para a existência de cerca de 18 185 reclusos, contra uma capacidade de 8.188 perfazendo uma superlotação de cerca de 221%. Destes reclusos, cerca de 37% cumprem penas de ate um ano de prisão e 40% penas de até 8 anos, o que tornava estes condenados, candidatos elegíveis as alternativas à pena de prisão.
A oradora destacou que o cumprimento da lei durante o período de 2015 a 2019 a este respeito, foi muito fraco; houve confusão de papeis (ex: os juízes continuam a impor e alocar os condenados, papel este do Serviço de Penas Alternativas à Pena de Prisão – SPAPP); disparidade entre os dados do SPAPP e do Tribunal Supremo (TS). No período de 2015 a 2018 o SPAPP apresentou 1324 casos de trabalho socialmente útil (TSU), contra 729 do TS.
De forma a concluir, a oradora deixou ficar as seguintes recomendações: alocar recursos humanos, materiais e financeiros para o SPAPP; alocar pessoal permanente e com formação para o SPAPP e todos os actores de justiça; melhorar as capacidades dos recursos técnicos, principalmente para as repartições do SPAPP; garantir o apoio inicial dos doadores e criar estratégias e procedimentos de gestão claros.
Após as apresentações, seguiu-se a sessão de perguntas e respostas. O sentimento geral é que as penas não privativas da liberdade são brandas, sendo portanto, necessário que haja um trabalho de aproximação e reconciliação entre a vítima e o infractor. A questão de mudança de mentalidade é crucial e o processo de sensibilização da comunidade tornar-se-ia mais simples. Os representantes do SERNAP compartilharam que é difícil tarefa conciliar o trabalho de gestão das prisões com aquela do TSU. A opinião comum é que o TSU deveria sair da responsabilidade do SERNAP e se entregue a uma entidade independente.
Magistrados judiciais continuam não conhecendo o SPAPP, dificultando ainda mais a implementação do TSU. A isso precisa adicionar a falta de meios. Em particular, a falta de transporte foi considerada por uma magistrada judicial preocupante, algo que limita a concessão do TSU. Na pratica, os condenados ao TSU, não podendo ser conduzidos a prisão, deveriam ser imediatamente atendidos no tribunal. Entretanto, a deslocação dos funcionários do SPAPP, das prisões para os tribunais não acontece de imediato, deixando os magistrados sem saber como actuar.
As alternativas à prisão são uma tendência mundial que vai a passo com a humanização das penas. O Estado encontra se no momento certo para decidir qual direcção dar as alternativas a prisão. Entretanto, há desafios que devem ser superados. A cultura punitiva de todo o sistema de justiça criminal é paralela à cultura punitiva da comunidade.
Mas há uma luz no fundo do túnel. A justiça restaurativa, que tanto estas alternativas à prisão querem elevar vem de África e de Moçambique.